Como a criança interior influencia nos relacionamentos afetivos?
Algumas pessoas me perguntam sobre a relação entre a criança interior e os desafios nos relacionamentos afetivos. Acho que não há forma melhor de falar sobre isso do que trazer alguns exemplos.
Eu facilitava uma Constelação certa vez, e uma mulher buscava ajuda para lidar com os relacionamentos amorosos. Ela queria entender por que buscava sempre por parceiros “indisponíveis” – foi o termo que ela mesma usou.
O campo foi se abrindo e revelando a forma como ela se colocava nesses relacionamentos, sempre com medo de abandono e paradoxalmente, com uma necessidade imensa de cuidar dos parceiros. No entanto, o que não estava sendo visto era que, no fundo, a dor de abandono vivida na infância estava sendo projetada nos relacionamentos afetivos. Era como se uma parte dentro dessa mulher dissesse aos homens: “Farei tudo por você, farei tudo pelo relacionamento, darei a nós tudo o que não recebi para que, desta vez, eu seja digna de receber”.
Este é um exemplo de uma dinâmica inconsciente, um impulso de recriar a ferida infantil para que seja possível, desta vez, superá-la, mas que na maioria das vezes só gera ainda mais dor no corpo emocional.
Como podemos ver nesse exemplo acima, a criança interior que registrou o abandono e a crença de não ser digna de amor, estava sendo abandonada novamente – e, desta vez, pela adulta que ela é hoje.
Lembro-me de um outro caso, de um homem cuja queixa era de relacionamentos com mulheres fortes e dominadoras – com excesso de energia yang. Ele relatava que a fase do namoro era sempre linda, mas conforme o relacionamento se prolongava, o padrão se repetia e ele se via impotente, sem energia e imerso em uma “culpa de existir”.
À medida que fomos mergulhando nos dois movimentos essenciais — resgatar a criança interior e tomar a vida que recebemos através de nossos pais — esse homem foi acessando seus fragmentos perdidos, descongelando lágrimas não choradas e camufladas entre a raiva e a apatia que sentia na infância. Ele percebeu que estava tentando recriar o relacionamento de seus pais, cuja mãe era uma mulher forte e dominadora, e o pai, um homem que se sentia derrotado e fragilizado perante a vida. De novo, a tentativa vã de escrever uma história diferente e “salvar-se” do próprio passado.
Não há problema algum em escolhermos escrever uma nova história, diferente daquela que vivemos ou presenciamos na infância. O problema é quando fazemos isso na tentativa de “salvar o passado”. Esse passado que nos habita hoje precisa ser visto, reconhecido, sentido e tomado como fonte de força. Dizer sim a tudo o que foi e como foi, libera o fluxo da vida.
Esses são dois de inúmeros exemplos que eu teria para contar, além do meu próprio. Hoje tenho absoluta certeza de que não há fluxo de vida enquanto não pudermos acolher e amar integralmente a nossa criança interior, e tomar a vida que recebemos de nossos pais com honra e gratidão, liberando-os de qualquer m’ágoa ou exigência que ainda possa existir. Falo disso também no meu primeiro livro: Movimento do Amor: a cura da criança interior e o desbloqueio do fluxo da vida.
O encontro com a Criança Interior nos leva a um movimento de amor próprio, de autocuidado e autorresponsabilidade. A Constelação Familiar Sistêmica e, principalmente, o movimento de agradecer a vida que recebemos de nossos pais, honrando-os completamente, libera o fluxo da vida. Esses são os movimentos básicos e essenciais da jornada de despertar. Essa é a força motriz do movimento do amor.
Com carinho,
Tatiane Guedes
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