O salto no desconhecido
Certezas? Garantias? Será que isso existe nesta ordem de realidade relativa, neste mundo de formas aparentes?
Já sabemos que não, mas na maioria das vezes estamos tão envolvidos com narrativas sobre passado e futuro, que esse saber fica guardado na prateleira de conceitos.
No entanto, inevitavelmente esse saber corporifica-se em sabor. E saborear a certeza da incerteza pode ser ora apavorante, ora libertador.
Reconhecer a impermanência torna a morte evidente. E será ela uma vilã vestida de preto como nos filmes de terror, ou uma sábia anciã do tempo linear?
Morte, mulher selvagem.
Sábia anciã do tempo.
Entra e faça sua dança em Mim.
E na imortalidade que Sou,
eu me experimento na tua dilacerante impermanência.
Bem-vinda morte de estruturas de pensamento geradoras de emoções e padrões comportamentais. Bem-vinda morte de formas de se relacionar sob a ilusão do controle, medo ou carência. Bem-vinda morte de ideias e ideais, de visões de futuro – a morte do próprio futuro quando se sabe que tudo o que existe é o agora.
Tem também a morte dilacerante da forma física daqueles que amamos, e do nosso próprio templo-corpo que está a morrer a cada segundo.
Como é difícil te ver, morte! Mas, como tu nos ensina sobre impermanência, sobre os saltos no desconhecido, sobre rendição e sobre o sabor de não-saber.
Às vezes saboreio a morte com medo, noutras, a degusto em paz. Às vezes ela me chega como saudade e libertação, outras como tristeza e negação. In-forma-ações simplesmente fluindo neste espaço sem bordas que Sou.
Acima de tudo, a morte traz pausa e silêncio, espelha a eternidade daquilo que não tem forma e, paradoxalmente, desperta uma gratidão apaixonada e apaixonante pela vida!
Abaixo compartilho algumas das muitas passagens do livro “Apaixonado pelo mundo: A jornada de um monge pelos bardos do viver e do morrer” de Mingyur Rinpoche, que tanto me espelhou esse saber-sabor de não saber.
Um deleite estar viva para re-conhecer tudo isso!
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“A confiança não pode amadurecer sem a aceitação da incerteza.”
“Quando nos sentimos ameaçados pela mudança, tentamos manter as coisas no lugar. Mas, se não pudermos conscientemente permitir que os padrões morram, então não podemos aproveitar os benefícios energizantes da regeneração.”
“O ponto chave é que não há um ego a ser morto. O que morre é a crença em um eu permanente e imutável. O termo ego ainda pode fornecer uma referência útil; mas precisamos ter cuidado para não iniciarmos uma batalha contra algo que não existe.”
“Todo movimento da mente, e toda reação emocional, ainda é apenas uma pequena onda na vasta superfície da mente desperta.”
“Vislumbres de consciência plena pura podem ser transformadores, mas é preciso trabalhar para estabilizar a visão.”
“Muito do medo da morte física diz respeito à morte do ego, à morte das máscaras. Mas, se soubéssemos que existe uma realidade maior na qual vivemos, poderíamos ter menos receio da nossa própria autenticidade.”
“Quando abandonamos a crença de que as coisas são imutáveis e aceitamos a experiência de que tudo é transitório, a tensão entre nossas expectativas e a realidade como ela é começa a se dissolver; nesse caso, saberemos que a perturbação desse momento vai passar e que, se mantivermos o reconhecimento da consciência plena, o problema se transformará sozinho.”
“Quase morri e isso me libertou. Livre para quê? Para morrer repetidas vezes; livre para viver sem medo de morrer. Sem medo de viver. Livre para morrer todos os dias. Livre para viver sem constrangimento.”
“A incerteza não mais me obrigava a correr em direção à segurança; em vez disso, queria me lançar no mundo desconhecido, abraçar seus mistérios e tristezas, estar apaixonado pelo amor, ser acolhido pelo amor, viver com perfeita serenidade em meu novo lar.”
“Estar vivo sem despertar para a verdade da vacuidade é como se juntar aos mortos-vivos.”
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Tag:impermanência, morte, silêncio